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Novo recorde mundial
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Tecnologia espacial nos Paraolímpicos

21/09/2004 1042 views 1 likes
ESA / Space in Member States / Portugal

Nos Jogos Paraolímpicos de 2004, a decorrer esta semana, Wojtek Czyz, o recordista mundial do salto em comprimento contará, com a ajuda de tecnologia e perícia espaciais para tentar conquistar a sua primeira medalha olímpica. Partes da prótese que irá usar na competição foram fabricadas com materiais concebidos para o espaço para as tornar mais fortes e mais leves.

Czyz perdeu parte da sua perna esquerda num acidente desportivo há três anos e, para prosseguir a sua paixão por “tudo o que tem a ver com desporto”, foi necessária a utilização de uma prótese.

“Tinha um grave problema com a minha prótese anterior, já que o ângulo de ligação entre o joelho e a mola da perna partia-se muitas vezes quando fazia salto em comprimento," explicou. Não se tratava apenas de um problema prático mas, mais importante do que isso, criava uma barreira psicológica. “Quando treinava estava sempre com medo que a prótese saísse do lugar e nunca sabia até que ponto poderia chegar com a minha prótese ao saltar."

Materiais espaciais para a resolução de problemas

Salto em comprimento com tecnologia espacial
Salto em comprimento com tecnologia espacial

A maioria das pessoas com deficiência tem que confiar nas próteses ‘padrão’ para utilizar no dia-a-dia e existe um mercado muito limitado de componentes feitos por medida para actividades desportivas. As próteses padrão utilizadas pelos atletas podem ser optimizadas para redução do peso e desenhadas de acordo com as condições de esforço a que estão sujeitas nos desportos de competição.

O Gabinete de Promoção e Transferência Tecnológica da ESA, em conjunto com a MST Aerospace, o agente de transferência tecnológica alemão que gere a Rede de Transferência Tecnológica da ESA, tomou conhecimento do problema do atleta através de reportagens na TV alemã e na imprensa. Na sequência de contactos com Czyz para identificar as necessidades mais cruciais em termos tecnológicos, a ESA e a MST decidiram analisar o problema.

A tecnologia espacial pode ajudar as pessoas com deficiência
A tecnologia espacial pode ajudar as pessoas com deficiência

"O objectivo," comentou Pierre Brisson, Director do Gabinete de Promoção e Transferência Tecnológica da ESA "era encontrar soluções baseadas nas tecnologias espaciais para as pessoas com deficiência, no sentido de as ajudar a participar nos desportos a nível competitivo e, ao mesmo tempo, desfrutar de uma melhor qualidade de vida."

Em colaboração com Wojtek Czyz, foram identificadas três áreas que precisavam de ser aperfeiçoadas: o membro artificial em si e as condições quer de preparação quer de treino.

Os procedimentos biomédicos determinaram quais as partes das próteses que poderiam ser melhoradas para correr e saltar e tornou-se claro que o principal problema era o elemento de articulação do joelho, nomeadamente o suporte em forma de L entre o joelho artificial e a chaveta de carbono, que substitui a parte inferior da perna.

Wojtek Czyz
Wojtek Czyz

Em nome da ESA, a MST contactou a ISATEC, uma empresa alemã com experiência na utilização de materiais de alto desempenho em projectos espaciais, tais como ligas de alumínio de elevada resistência, titânio e plástico reforçado com fibras de carbono (CFRP). Esta empresa dedica-se à concepção e análise de estruturas em CFRP utilizadas nos motores dos foguetões e ao Espectómetro Magnético Alfa (AMS) na Estação Espacial Internacional (ISS). O AMS é um detector concebido para o estudo extraterrestre da antimatéria, matéria e ausência de matéria. Utilizando as mesmas técnicas e conhecimentos, a ISATEC analisou e optimizou o suporte em forma de L para melhorar o desempenho do membro artificial nos desportos de competição.

"Análises mais pormenorizadas determinaram soluções diferentes para desportos diferentes, cada uma das quais optimizada para uma utilização específica," explica Johannes Schmidt, Director de Projectos da MST. "Para a corrida, foi desenvolvido um suporte fabricado com uma liga de alumínio de alta resistência, material utilizado pela ESA no seu instrumento AMS."

Czyz com a sua prótese aperfeiçoada para o salto em comprimento
Czyz com a sua prótese aperfeiçoada para o salto em comprimento

"No salto em comprimento, a situação é diferente e foi fabricado um suporte em fibra de carbono e camadas de tecido," prossegue Johannes Schmidt. "Depois da opinião do atleta, a primeira versão foi alterada e construída uma segunda versão mais macia."

A análise de pressão camada a camada efectuada em mais de 40 telas unidireccionais e de tecido foi particularmente importante, uma vez que permitiu assegurar que o material seleccionado para o suporte era suficientemente forte para aguentar a carga adicional durante o salto em comprimento. O novo suporte em forma de L, mais rígido e resistente, é também mais leve e forte, oferecendo aos atletas uma maior segurança durante os treinos.

"Foram muitos anos de trabalho na utilização e aperfeiçoamento destes materiais especiais para uso no espaço que permitiram produzir os suportes de elevado desempenho para a prótese de Czyz," comentou Schmidt.

Treino

Nos treinos
Nos treinos

Czyz informou também a MST que tinha problemas na colocação da prótese na perna. "Dependendo do meu estado geral de saúde, o tamanho do coto pode aumentar ou diminuir, o que torna difícil a colocação da prótese de uma forma segura. Chegou até a cair durante algumas sessões de treino."

Após uma troca de ideias com o Centro Europeu de Astronautas (EAC) e a Rede Europeia de Cuidados de Saúde, criada pela ESA para desenvolver, promover e comercializar soluções para a saúde e o bem-estar resultantes da investigação e desenvolvimento espacial, o Director da Rede de Cuidados de Saúde da ESA, Filippo Ongaro, sugeriu a utilização do Estimulador Muscular Eléctrico Percutâneo (PEMS) para evitar a atrofia dos músculos e aumentar a massa muscular.

Czyz com a PEMS II
Czyz com a PEMS II

O PEMS foi desenvolvido e fabricado pela empresa suíça Syderal para prevenir os efeitos da microgravidade nos astronautas, em especial a atrofia dos músculos e os seus efeitos paralelos, tais como a mineralização dos ossos e o descondicionamento cardiovascular. Em 1996, o PEMS I viajou no Space Shuttle e está previsto que o PEMS II seja entregue à ISS no próximo mês de Maio.

Em Junho deste ano, ao Directorado de Voos Espaciais Tripulados da ESA disponibilizou o dispositivo de treino PEMS II, que foi instalado na Universidade de Desporto Alemã em Colónia (DSHS) para ajudar Czyz a aumentar a massa muscular e reduzir a atrofia na perna. O treino foi seguido pelo Professor Narici da Universidade de Manchester, que já tinha efectuado pesquisas intensivas com o PEMS I e II, pelo Dr. Zange do Instituto de Medicina Aeroespacial no Centro Aeroespacial Alemão (DLR) com o apoio do Dr. Scheider e do Dr. Abel do Instituto de Controlo Motor e Técnicas de Movimento no DSHS, e do Prof. Maffulli da Faculdade de Medicina da Universidade de Keele. O DLR também disponibilizou as instalações de teste em Köln Porz.

"Tive oportunidade de treinar durante 10 semanas com o PEMS. Desenvolvi a massa muscular da minha perna e já não tenho problemas ao colocar a prótese. Mesmo quando não estou bem, a massa muscular da minha perna permanece inalterável," comentou Czyz.

Preparação para as corridas dos 100 m e 200 m
Preparação para as corridas dos 100 m e 200 m

Para os treinos, o atleta usava um fato de treino desenvolvido pela marca italiana Grado Zero Espace utilizando uma membrana de memória da forma, baseada num polímero usado em aplicações espaciais como espuma para as rodas flexíveis dos jeeps planetários, bem como para estruturas espaciais desdobráveis.

Czyz espera ainda ganhar medalhas nas corridas dos 100 m e 200 m mas a sua principal paixão é o salto em comprimento. "Vou estar muito nervoso, já que participar nas Olimpíadas não é o mesmo que saltar em casa. Em 2003, bati o recorde mundial com um salto de 5,85 metros e, com as peças redesenhadas da prótese, os meus saltos aumentaram em 20 cm. Espero obter um novo recorde Olímpico em Atenas ultrapassando os 6 m."

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